Cadeia Municipal, atual Presídio

Caiuá Cardoso Al-Alam
Defronte a antiga Praça da Constituição, que fazia alusão a primeira carta magna do estado brasileiro promulgada em 1824, reside até hoje o prédio da cadeia, conhecido também como presídio estadual. É um dos exemplares raros de prédio de cadeia construído no século XIX e que continua sendo utilizado para o mesmo fim. Tombado pelo IPHAE, e com muitas dificuldades de manutenção devido o prédio ser antigo e pouco adaptável para acolher de forma adequada quem cumpre pena de prisão na localidade, a edificação constitui-se um patrimônio do Estado.
Próximo ao rio Jaguarão, foi colocado naquela posição geográfica não por acaso. No final da década de 1850, os vereadores procuravam constituir um espaço que pudesse ser edificado um prédio de prisão, pois até então as casas de cadeia eram realizadas em prédios alugados. O prédio da cadeia municipal foi inaugurado em 1862. E na beira do rio Jaguarão, ficaria próximo a água, mais fácil para despejos de fezes, longe dos olhares e convivência da urbe, evitando que miasmas, pestes, que pudessem se encontrar dentro do espaço, não atingissem a população.
Durante a escravidão, para lá foram enviados escravizados e escravizadas para cumprirem penas corretivas. A sociedade escravista tipificava diferentes crimes, como os de atentado contra a vida e propriedade, e dentro desta lógica as práticas que eram realizadas para liberdade ou reações ao sistema da escravidão, também eram criminalizadas. O sistema carcerário brasileiro foi forjado na perspectiva de uma atuação racializada, estruturado na prática de enquadramento da população negra, buscando realizar a propriedade escravista.
Mas interessante que, mesmo com uma estrutura policial complexa no século XIX, que demandava guardas permanentes municipais, corpo policial provincial, Guarda Nacional, Marinha, Exército, Capitães-do-mato, inspetores de quarteirão, a comunidade negra escravizada e liberta realizava suas sociabilidades e resistências. Em Jaguarão não existem mais os livros de registros de prisões, mas em Pelotas, o livro que sobrou é específico para prisões de escravizados, e um dos crimes mais evidentes nos registros é o de andar fora de hora nas ruas da cidade. Ou seja, mesmo com toda repressão, escravizados/as e libertos/as continuavam construindo suas vidas, seus sonhos, suas famílias, relações, mundo afro religioso, suas vivências. construindo suas vidas, seus sonhos, suas famílias, relações, mundo afro religioso, suas vivências. Flavio dos Santos Gomes chamou esta rede de sociabilidades e reciprocidades entre a comunidade negra, escravizada e liberta, que passava ao largo dos olhares senhoriais, de “campo negro”. Portanto, este espaço deve ser refletido como um lugar que representa a estrutura racista do sistema prisional e policial brasileiro, mas também como espaço onde fica evidente que nunca as comunidades negras, mesmo com estado policial extremamente repressivo, deixaram de viver suas lutas diárias, suas resistências.
Referências
AL-ALAM, Caiuá Cardoso. A negra forca da princesa: polícia, pena de morte e correção em Pelotas (1830-1857). Pelotas: Sebo Icária, Do Autor, 2008.
BOM, Matheus Batalha. Entre o ideal e o real: a cadeia civil de Jaguarão (1845-1870). Jaguarão: Unipampa, 2015 (Trabalho de Conclusão de Curso).
GOMES, Flávio dos Santos. Histórias de Quilombolas. Mocambos e comunidades de senzalas no Rio de Janeiro - século XIX. Rio de Janeiro, Arquivo Nacional, 1995.