Praça Alcides Marques,
antiga Praça 13 de Maio

Bruna Teles Mena
Vinicius Costa Franco
O princípio da ocupação desta cidade é marcado pela forte presença militar, as instalações da Guarda se deram na margem do rio Jaguarão e no espaço identificado Praça Militar, sendo esses locais onde hoje é respectivamente a Praça das Figueiras e a Praça Alcides Marques. Assim sendo, a segunda foi de grande significação desde os primeiros momentos de Jaguarão, sendo fundamental para o desenho urbano da cidade, que desenvolveria em seu entorno. Assim, a Praça Alcides Marques foi um local de expressão política e social, mais ocupada pelas elites da cidade, principalmente a partir da metade do século XIX, onde ali se instalaram as primeiras residências, sendo ocupada pela elite jaguarense.
A Praça como conhecemos hoje, está ligada ao projeto de desenvolvimento e embelezamento da cidade, surgindo em 1856 as primeiras manifestações no sentido de modernizar a praça central, com a implementação de elementos arbóreos em seu interior. Pela sua localização central, as casas mais bem ornamentadas acabaram localizadas à sua volta, numa expressão nítida do poder econômico. Este processo de desenvolvimento foi comum nas cidades da América Latina, estabelecendo nas praças um aspecto romântico e de contemplação. Ao mesmo tempo que há este embelezamento, também se afirma uma hierarquização de quem poderia frequentar este espaço, sendo um local para lazer e contemplação da elite branca, e a exclusão do povo negro, este último concentrando sua circulação na parte próxima ao rio, onde havia as demandas de serviços.
A efervescência dos argumentos abolicionistas, o incômodo dos projetos públicos de infraestrutura com a popula-ção negra, e o almejo de uma cidade aos moldes das cidades europeias, com cidadãos majoritariamente brancos, foi de extrema importância para os posicionamentos políticos da elite estancieira e escravocrata, que começavam a pautar a agenda republicana. Sujeitos da elite, com plantéis de escravizados, se organizavam em sociedades republicanas, a exemplo da sociedade Cassino Jaguarense (1884) e a Sociedade Emancipadora Jaguarense, que promoviam, no último quarto do século XIX, festas de distribuição de alforrias, em sua maior a partir de contratos de serviços a cumprir por parte do escravizado, para efetivar sua liberdade.
Assim, é evidente uma apropriação deste momento político para ressignificar o discurso sobre a escravidão, e a Praça se tornou um símbolo deste posicionamento político da elite jaguarense. No ano seguinte ao fim da escravidão, que se deu em 13 de maio de 1888, houve a construção de símbolos, na área central da cidade, representada na Praça, que remetiam a liberdade recém conquistada: a Estátua da Liberdade, situada à frente da Igreja da Matriz, quem fevereiro do ano seguinte a abolição, a Câmara decide levantar uma “estátua da liberdade”, em um espaço privilegiado na praça central da cidade, para comemorar a “gloriosa data”; Praça que também foi batizada com o nome de Praça 13 de Maio, em alusão ao dia da abolição; ornamentos nas casas ao redor da Praça, como os ornamentos na residência do charqueador e proprietário de escravizados, Zeferino Lopes de Moura, logo a frente da Praça Alcides Marques, que construiu, provavelmente na década de 1890, uma estátua de uma figura feminina com correntes rompidas na mão, bem acima da fachada, representando a liberdade conquistada pela abolição.
Essa manifestação, e apropriação dos discursos abolicionistas, por parte das elites da cidade se mostrou de extre-ma importância para a manutenção de seu status quo neste contexto de mudança na sociedade. A elite de Jaguarão usufruiu até o fim da mão-de-obra escravizada, através dos dados sobre a lista de matrículas dos escravizados elaborada pela Diretoria Geral de Estatísticas em 1872-73, ainda existiam 4.592 escravizados matriculados. Em 1885, segundo Relatório do Presidente da Província, ainda havia 1.232 escravizados/as. A narrativa republicana e abolicionista, buscou suprimir a resistência do povo negro e sua luta por liberdade. Porém a comunidade negra não estava passiva a este processo, e acionou a própria narrativa republicana para reivindicar melhores condições de cidadania, e mesmo com a agenda política da abolição sendo capitaneada pelas elites, a população negra celebrou e memorizou o 13 de maio como uma conquista. É significativa a troca de nome da Praça 13 de maio para Praça Dr. Alcides Marques, mostrando um apagamento dessa memória da escravidão. Porém a Praça, foi e ainda é um local de concentração de luta antirracista, e principalmente de subversão da ordem nos períodos de festa do carnaval, onde prevalece como espaço de circulação e poder do povo negro jaguarense.
Referências
LIMA, Andrea da Gama. O Legado da Escravidão na Formação do Patrimônio Cultural Jaguarense (1802 – 1888). Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Memória Social e Patrimônio Cultural. Pelotas, 2010.
MARTINS, Roberto Duarte. A ocupação do espaço na fronteira Brasil - Uruguay: a construção da cidade de Jaguarão. Universitat Politècnica de Catalunya. Escola Técnica Superior D’Arquitetura, 2001.
FERRER, Francisca Carla Santos. Entre a liberdade e a escravidão na fronteira meridional do Brasil: estratégias e resistências dos escravos na cidade de Jaguarão entre 1865 a 1888. São Paulo: USP, 2011. (Tese de Doutorado).