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Rastilho

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Caiuá Cardoso Al-Alam

         Ramão Machado, conhecido como Negro Rastilho, epíteto lhe dado pela fama relacionada a prática do roubo, foi morto pela polícia no dia 8 de março de 1943, na beira do Arroio Juncal, no 2º Subdistrito, em Santana. Perseguido, foi encontrado numa cova seca na beira do arroio, nos campos do Dr. Constantino Lila da Silveira. Resistiu à prisão, abrindo tiros contra os que o perseguiam, sendo executado dentro da cova.

           Alfredo Crispim, capataz da granja Belóca, de propriedade do Sr. Dr. Mirabeau Baltar, onde Rastilho está enterrado, relata sua história e canonização popular em matéria de jornal A Folha do dia 15 de janeiro de 1955. O espaço até hoje é frequentado por muitos populares que vão lá fazer pedidos e agradecimentos ao Negro Rastilho, realizando orações e oferendas, como velas e cachaça.

        Em 5 de fevereiro do mesmo ano, é publicado um texto a pedido, assinado por Luiz Cassuriaga, prefeito do 2º Subdistrito, e que teria sido escrito para “esclarecer” as informações. A autoridade dizia que não teria sido “uma malta de policiais” de Jaguarão e Arroio Grande que perseguiram Rastilho o matando, e sim ele mesmo e o guarda rural Orotildes Pereira Alves. Reivindicava a façanha. De acordo com Cassuriaga, Rastilho teria sido surpreendido ao tentar roubar um domicílio rural, e perseguido, reagindo com tiros, o que fez com que outras pessoas corressem atrás dele. Fugindo, se “entrincheirou numa cova feita pela água do rio Juncal”, reagindo com seus dois revólveres. Acuado, acabou alvejado com cinco tiros, morrendo no local. Rastilho estava com os pertences de Gabriel Corrêa da Silva, supostamente roubados na semana anterior de sua residência: um revólver com cabo madrepérola, um relógio de algibeira da marca “ômega” e um outro de marca “Ramenzoni”. Luiz Cassuriaga alegou terem agido em legítima defesa, o que é questionável, já que Rastilho ficou acuado em um buraco, sendo executado. Meses após o acontecido, o proprietário da fazenda, Dr. Constantino Lila da Silveira, teria solicitado que o corpo de Rastilho fosse retirado de sua propriedade, já que havia sido enterrado no local. Ao exumarem o corpo e observado o estado putrefato que se encontrava, o Dr. Mirabeau Baltar autorizou que Rastilho fosse enterrado em campo seu. A partir daí começaram os relatos relacionados aos casos de milagre realizados por ele.

          Em 1959, um poema intitulado Negro Rastilho, assinado por Luiz Felippe Amaro da Silveira, em homenagem ao Dr. Mirabeau Pacheco Baltar, o dono da propriedade onde foi enterrado Rastilho, faz referência a este como “negro guapo e andarilho, mui peleador e campeiro”. Comparava a contação de sua história com a do Negrinho do Pastoreio, de tão famosa na época, andando de boca em boca. Faz referência a Rastilho como “criado em beira de rancho, tinha baldas de carancho e manhas de sorro esperto”. A referência a prática de roubo parece estar naturalizada na figura de Rastilho, inclusive no seu apelido isto fica evidente, mas no poema a justificativa era a fome, certamente a situação de penúria da peonanada pobre que trabalhava esporadicamente nas estâncias, em sua maioria homens negros. No fim do poema, a referência à santificação de Rastilho vem à tona, “Santo campeiro num ritual campeiro: um túmulo solito...canha e velas...e seus milagres hoje se esparramam. Se pedem chuva o Negro manda chuva. Se querem sol o Negro para a chuva”. Dizem os relatos que o proprietário do campo onde está enterrado o Negro Rastilho, Dr. Mirabeau, certo dia injuriado e já desesperançoso com a falta de chuvas para a lavoura, pediu a ele que enviasse chuva, que logo veio. A partir de então, populares realizam oferendas em seu túmulo, construído com um funil para ser colocado cachaça ao santo. Fica evidente a relação com a figura de Exú, importante entidade das religiões de matriz africana na região, evidenciando que alguns elementos são objetivamente relacionados a experiência do povo negro no local. É um território com vínculos ao imaginário popular religioso africano, na resistência de um homem negro que até hoje recebe leituras racistas sobre a sua experiência, o desmerecendo retratando como um ladrão. Negro Rastilho ficou encantado, histórias são vinculadas a ele, como a gaita que tocava (a música novamente vinculada a perspectiva mágica da encruzilhada-Exú, como no blues de Robert Johnson), a realização de práticas quase mágicas que faziam desaparecer utensílios e objetos, e até mesmo sua alma bondosa e ingênua.

Referências

CALDEIRA, Alef Franco; FARINHA, Alessandra Buriol. O Negro Do Rastilho: Memória Social e Identidade Cultural em Jaguarão, RS. RELACult - Revista Latino-Americana De Estudos Em Cultura E Sociedade, 2(4), 2016, p. 831–843.

IHGJ. Jornal A Folha. Dia 5 de fevereiro de 1955.e 11 de julho de 1959.

UNES, Geice Peres. Os caminhos de Rastilho: expressões da literatura oral na fronteira sulriograndense. BOITATÁ, Londrina, n. 23, jan-jul 2017, p. 164-178.

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