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Rua do Cordão

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Isadora Teixeira da Cunha

         A região da atual rua Barbosa Neto no bairro Vencato, no local que faz a curva entre as ruas Fernandes Vieira e Mena Barreto, na cidade de Jaguarão, já foi conhecida como Rua do Cordão, nome que fazia referência a tradicionais ritos e festejos de matriz africana. Hoje há, próximo ao local, uma rua com o mesmo nome, batizada pela Câmara Municipal no ano de 1996. Tradicionalmente conhecida como uma rua que abrigava diversas famílias negras, aparece como referência de espaço de sociabilidade destes núcleos desde o século passado. O nome faz referência aos populares cordões carnavalescos, que marcaram presença no espaço, mas não só a estes vislumbram-se o território em questão. Aqueles que passaram pela escravização, após conquistarem a liberdade e fixarem-se ao espaço referenciado, praticavam ainda antigos ritos funerários africano. Os cordões fúnebres parecem ter servido então como referência aos futuros cordões carnavalescos e como forma de ressignificação de aspectos culturais de sua origem que mais tarde se fizeram presentes nos festejos da cidade.

        Chamar o espaço de Rua do Cordão, pode ser lido também como um ato de resistência e formação de uma identidade. Tendo em vista que além das origens citadas anteriormente a rua pode ter adquirido este nome em homenagem a um grupo de mulheres negras que residiam na localidade. O coletivo, identificado como Cordão das Minas, é lembrado por sua vinculação aos festejos de carnaval, e tinham como marca seus vestidos brancos e as canções que entoavam, os cantos em questão faziam referência a África, celebrando suas origens.

          Enquanto espaço que se perpetuou como local de sociabilidade de famílias negras, a região da antiga Rua do Cordão, traz em sua história a presença de lideranças negras fortes e que marcaram a cidade, como é o caso de Osvaldo Emílio Medeiros, o Mestre Vado. Apaixonado por música, Mestre Vado começou cedo, aos 12 anos tomou aulas com Mestre Euclides, baiano que chegou a Jaguarão com o exército e ficou alguns meses na cidade. Circulou por outros outros territórios negros da cidade, sendo um grande exemplo de laços formados pela sociabilidade desses espaços. Aos 13 anos foi convidado por Theodoro Rodrigues, para sair no Cordão Carnavalesco União da Classe, cordão vinculado ao Clube 24 de Agosto.

          Mestre Vado não ficou detido ao nosso lado da fronteira, como é tradição na zona fronteiriça, a troca é a lei. Participou de folias nos clubes da cidade uruguaia vizinha de Rio Branco e de seus cordões carnavalescos. Vado viveu para a música, fazendo dela parte central da sua vida. Ensinou desde muito cedo o que aprendeu e deixou registrado a importância que dava ao estudo, nas palavras do próprio Mestre: o estudo é o progresso da juventude. Como nunca se negou a compartilhar seus conhecimentos, também foi generoso ao dividir suas memórias do local onde nasceu, a Rua do Cordão.

           Ao dividir suas lembranças em entrevistas, contava das memórias relacionadas a avó, uma ex-escravizada que fez da Rua do Cordão seu lar. A marca significativa do poder da história contada, que passa de geração para geração lutando contra o esquecimento, se apresenta nas memórias do Mestre que recontava o que ouvia da avó sobre os cordões funerários e os ritos africanos que fizeram parte e marcaram a história desse espaço.

         Entre os emblemáticos moradores da antiga Rua do Cordão, encontramos o Sr. Nergipe Machado, referência nos clubes e organizações da comunidade negra. Que também nos faz perceber as fortes conexões entre esses territórios. Em suas memórias guardava, e muito generosamente não se recusou a dividir, as lembranças que tinha dos cordões carnavalescos, da importância de um local como o Clube 24 de Agosto, fundado para receber aqueles/as que não podiam se associar em outras instituições clubistas por serem de brancos na cidade.

          A importância de ressaltar e reafirmar a antiga Rua do Cordão como um espaço de sociabilidade, luta e memória  da população negra na cidade de Jaguarão, está diretamente vinculada à necessidade de manutenção de uma história que está muito marcada pela oralidade. Como Mestre Vado lembrava das histórias da avó sobre os cordões e ritos e as compartilhou; como o Sr. Nergipe fez ao compartilhar suas lembranças de outros espaços, como morador da rua e liderança de sua comunidade. Visitar, demarcar e questionar sobre esse espaço também é uma forma de perpetuar as histórias que foram vividas e que nasceram ali.

Referências

AL-ALAM, Caiuá Cardoso. O Jaguarense no jornal A Alvorada (1932-1934): imprensa negra e política na fronteira Brasil-Uruguai. MÉTIS: história & cultura – v. 19, n. 37, p. 54-79, jan./jun. 2020.

ARENCE, Maria Túlia Duarte Mendes. Práticas de ensino da história e cultura afro-brasileira. Jaguarão: Universidade Federal do Pampa, 2015. (Dissertação de Mestrado)

NUNES, Juliana dos Santos. "Somos o Suco do Carnaval": A Marchinha Carnavalesca e o Cordão do Clube Social 24 de Agosto. Pelotas: Universidade Federal de Pelotas, 2010. (Trabalho de Conclusão de Curso).

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